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 Movimentos Tribuna 77 e Grêmio Antifascista  presentes na Arena do Grêmio / Reprodução Twitter: Tribuna 77

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R.J. - Torcida Grêmio Antifascista
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Algumas torcidas/movimentos presentes em protesto político no dia 29/09 - Reprodução Facebook: Movimento Toda Poderosa Corinthiana 

Foto: Lucas Capeloci - Mesa "Políticas e formas de torcer"

Foto: Lucas Capeloci 

O gaúcho fala sobre o processo de elitização que ocorreu em seu clube a partir de 2012, quando o time do Grêmio se muda do tradicional estádio Olímpico, para a nova e moderna Arena Grêmio: “Foi quando tivemos o primeiro baque da elitização, a arena foi construída em um lugar muito afastado na cidade, e ironicamente ou pra nossa sorte foi para uma vila, então isso ajudou na questão do pertencimento da comunidade, embora ela ainda esteja fora do estádio. Ela (arena) elitizou o público principalmente no começo de 2013, quando começa a ter jogos oficiais”.

O representante do movimento explica o desconforto de início com algo que gera muita reclamação das torcidas populares e que estão acostumadas com a tradicional festa atrás de um dos gols, a chamada ‘geral’, local onde em que nas novas arenas acabam tendo dificuldades pela presença de cadeiras. “Tinha muita repressão de ficar de pé, torcendo, cantando, tirar a camisa. Tinham guardas que mandavam a gente sentar e teve uma briga para manter um espaço sem cadeiras, que é o setor atualmente da geral”, comenta R.J.

O gremista conta que uma das práticas do movimento junto com a Tribuna 77, torcida que questiona as práticas de poder, éticas sociais e política dentro e fora dos estádios, é institucionalizar um grupo para colocar pessoas no conselho do clube.

Em um dos auditórios do prédio de História e Geografia da USP, a mesa “Gestão Esportiva e Políticas” também debateu o tema da elitização no futebol brasileiro, no dia 28 de setembro de 2018, durante a semana do Simpósio.  Além de Flávio de Campos, estava presente na bancada José Luiz Portella, engenheiro civil, especializado em gerenciamento de projetos. Foi secretário-executivo dos Ministérios do Esporte e do Transporte.

Ele debate sobre o acesso da torcida popular às novas arenas: “É possível fazer uma boa gestão com ingresso acessível”. Porém discute a existência de desconto para poucos, já que os locais com tal diminuição do preço, no caso da Arena Palmeiras, o setor ‘gol norte’, os ingressos esgotam em questão de minutos para os sócios torcedores. “O torcedor comum não é obrigado a virar sócio Avanti (nome do programa de torcedores do Palmeiras). Eu conheço gente mais humilde que nunca foi no Allianz Parque, as vezes eles vão lá na frente só para tirar foto.”

Questionado sobre uma maior participação democrática como uma das soluções dessa questão, Portella é pessimista, argumentando a necessidade de mais torcedores, principalmente os que não são sócios do clube, participando de votações internas, coisa que não ocorre nas instituições futebolísticas.

Dentre os diversos pesquisadores, jornalistas, estudantes e torcedores que se organizam em grupos, movimento e/ou coletivos, presentes na semana do 3º Simpósio de Estudos sobre Futebol, estava R.J., um dos representantes da Grêmio Antifascista, torcida que leva à campo pautas como racismo, LGBTfobia, machismo, elitização, usando o futebol e o estádio como dispositivo para discutir tais assuntos amplamente.

O sociólogo e britânico Richard trouxe o assunto da participação da torcida na política de um clube. Para ele, é fundamental seu reconhecimento e papel institucionalizado no futebol: “Fãs tem um papel de vigilância para uma corrupção, governantes ruins, questões de jogos. Ter uma representação dos torcedores faz parte de uma transparência dentro das instituições futebolísticas. O futebol pode ser um lugar chave para essas mudanças acontecerem na sociedade”.

Para um dos principais estudiosos contemporâneos sobre o fenômeno esportivo e professor da Loughborough University, o torcedor tem a capacidade de corporificar a história de determinada comunidade e possui o papel de inclusão social. Estes, criam a atmosfera para a comercialização de um jogo, os fãs como produtores do futebol, e por isso devem ser escutados. “Não há modelo perfeito de democracia entre os torcedores. Talvez tivéssemos que ter um órgão que representasse os torcedores”, pondera e conclui Giulianotti.

Flávio de Campos, mestre em História Social pela Universidade de São Paulo e coordenador do LUDENS (Núcleo Interdisciplinar de Estudos Sobre Futebol e Modalidade Lúdicas), também contribui com seus estudiosos pitacos. Ele entra um pouco mais no viés político do assunto. Em sua fala, autointitulada de “Politização às avessas”, ele retrata o caos vivido antes da Copa do Mundo de 2014 no país e a mobilização popular contrária a tais investimentos no evento.

“O entrelaçamento da agenda esportiva à agenda política tornava-se ainda mais evidente. Do lado de fora dos gabinetes e palácios, entre junho de 2013 a junho de 2014, a questionadora palavra de ordem ‘Copa pra quem?’ passou a ser substituída pela temerária ‘Não vai ter copa!’, reeditando definições redutoras que desconsideram o futebol como um ingrediente da cultura das classes subalternizadas das sociedade contemporâneas e o compreendem apenas como elemento de alienação social”,  comentou Flávio, sobre as diversas manifestações político-sociais pré copa no Brasil.

O pesquisador sobre a História dos jogos desde a Idade Média até a Época Contemporânea, chega a comparar a organização de tais atos fora do estádio aos torcedores que ocupavam as gerais. Como por exemplo gritos de guerra como: “Pula sai do chão, contra o aumento do buzão” como paródia de “Pula sai do chão, faz ferver o caldeirão; e “O povo acordou” em referência ao “O campeão voltou”. As matrizes futebolísticas estavam na arquibancada das ruas.

No que diz respeito as mais variadas formas de torcer, por diferentes gêneros, identidades e ideais, Flávio de Campos finaliza destacando a resistência de movimentos, que visam ampliar o espaço de debate e a formulação de políticas públicas sobre esporte, lazer e o futebol em particular. “ É importante mencionar o papel dos coletivos de resistência, determinadas torcidas organizadas e associações de torcidas organizadas, que atuam no campo torcedor e que fazem o embate com os grupos fascistas e intolerantes disseminados nas mais variadas formas de torcer. Contra a barbárie e contra o fascismo, nossa resposta deve ser o fortalecimento das formas democráticas de torcer, gerir, pensar, brincar, festejas e disputar o futebol”.

Com a construção de novas arenas, a elitização entra em campo

Ela nasceu em 2014, logo após a Copa do Mundo realizada no Brasil. Os torcedores, raivosos, logo escolheram seu nome: elitização. Aos 4 anos de idade a grande maioria ainda a olha com desprezo. Ela havia invadido a segunda casa de muitos fanáticos que há anos frequentavam gerais, arquibancadas acessíveis, e ainda podiam desfrutar além da festa dentro dos estádios, da confraternização regada a cervejas e churrasco do lado de fora, em seu quintal.

A democratização e elitização nos clubes de futebol é uma pauta recorrente nas mídias. O espaço do torcedor mudou. Com isso, vociferam discussões a respeito da acessibilidade do futebol e sua nova feição perante a sociedade, abrindo porta para debates de cunho político, cultural e social dentre diversas pessoas.

Entre os dias 26 e 29 de setembro de 2018, ocorria o '3º Simpósio Internacional de Estudos sobre Futebol: Políticas, Diversidades e Intolerância'. No segundo dia do evento, em uma quinta feira chuvosa (27), era o dia da mesa “Políticas e Formas de Torcer”, com a presença de Richard Giulianotti, Juca Kfouri , Flávio de Campos e Rosana da Câmara no Sesc Pompéia, zona oeste da cidade de São Paulo.

Estádio do Morumbi, Pacaembu, Allianz Parque e Arena Corinthians

 

 

 

 

 

Em São Paulo, os times que dão nome aos dois polos da linha vermelha do metrô da cidade, Palmeiras (Barra Funda) e Corinthians (Itaquera), são os clubes que passaram pelo processo de modernização de seus estádios no pós-copa de 2014 no país. No caso alvinegro, que mandava seus jogos no estádio do Pacaembu, foi construído a Arena Corinthians, primeiro estádio do time, na zona leste. No lado alviverde, o antigo Palestra Itália deu lugar ao Allianz Parque.

As duas equipes que também mandavam alguns de seus jogos (inclusive clássicos) ao longo da história no Estádio do Morumbi, passaram por uma restruturação na gestão do futebol e viram o perfil de seus torcedores mudar. Hoje, a questão do negócio no futebol é mais vista na zona oeste da cidade, na arena Palmeirense. O clube é o que mais recebe shows em seu estádio na cidade, e também tem a média de ingresso mais cara do futebol paulista e brasileiro com o ticket médio no valor de R$ 69, seguido pelo rival Corinthians R$ 54 e Grêmio 44 R$. Os três times com seus estádios transformados em arenas. (Veja a tabela completa)

Alessandra Salgueiro, palmeirense e dona do site “A bola que pariu” – portal com as notícias dos principais times do país, feito somente por mulheres, comenta sobre a implementação das arenas e as novas gestões no futebol brasileiro, visando que o mesmo deve se modernizar em busca da melhoria do esporte no país: “O mundo mudou muito, consequentemente o futebol também precisa mudar”, disse a torcedora alviverde.

Porém, Salgueiro argumenta em seu contraponto que os ingressos podem ser mais baratos em alguns setores, a fim de abranger um maior público dentro de um estádio ou arena. Além disso, cita a limitação da festa nas arquibancadas, local culturalmente reservado as festas das grandes massas apaixonadas pelo esporte bretão: “O futebol está muito chato, em que nada pode. Ninguém pensa em uma prevenção (como em casos de violência entre torcidas), só se pensa em punição, só se pensa em proibição, e isso me incomoda profundamente”, lamenta a frequentadora assídua do Allianz Parque.

Cabe lembrar aqui, que, desde 2016, após confronto entre integrantes das torcidas Mancha Alvi Verde, do Palmeiras, e Gaviões da Fiel, do Corinthians, que deixou dezenas de feridos e um morto, o Ministério Público do Estado de São Paulo e a Secretaria de Segurança Pública, implementaram torcida única em clássicos no estado, além da proibição de bandeiras de mastro nas arquibancadas. 

Foto: Marcelo Gonçalves/Sigmapress/Estadão Conteúdo - Torcidas organizadas na praça Charles Miler

No mesmo ano, em 4 de dezembro de 2016, as torcidas organizadas de Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo prestaram apoio ao time da Chapecoense e as vítimas da tragédia do dia 28 de Novembro daquele ano. No ato, firmaram um "pacto de paz" nos estádios, a fim da liberação da torcida rival em clássicos. Os torcedores se uniam aos gritos de "Vamos vamos Chape!". Porém, o ato de solidariedade e pedido do fim da punição não foi atendido. 

 

Além da proibição de torcida rival em clássicos, os paulistanos não podem mais levar bandeiras de mastro para o estádio, desde 1995, quando a partida final disputada entre Palmeiras e São Paulo em uma competição Júnior, no Pacaembu, terminou em uma briga generalizada entre seus torcedores, com a morte de uma pessoa.

Jogador de alguns times de várzea, como, Celeste Proletária e Rosanegra ADF, João Paulo é torcedor do Palmeiras, e também fala sobre essa mudança ao acesso e em frequentar o novo e moderno estádio. Ele enxerga as frequentes punições como parte do processo de elitização dos estádios: “A torcida que fazia a festa, hoje não vai mais no jogo, tanto por essas proibições, tanto pelo preço do ingresso. A festa está ficando de lado, entrando um novo modelo de torcedor, que é o torcedor de teatro. Eles vão para o estádio, e se você canta ou assiste o jogo de pé você está atrapalhando a visão deles. Eles estão ali só para bater palma e aplaudir renda".

Ele atribui tais punições a falta de organização e devida ordem de órgãos responsáveis pela segurança no espaço esportivo: “A proibição é uma transferência de responsabilidade do Ministério Público de não garantir a segurança”.

Danilo Zamboni, sócio fundador da Torcida Tricolor Independente (TTI), em 1972, comenta sobre as proibições no cenário paulista dentro dos estádios: “Infelizmente falta um trabalho de prevenção nas praças esportivas, o que não foi feito nos anos 70, 80 e hoje estamos tendo problemas. Em relação à torcida única, ela resolve em partes, só que ela tira o direito do bom torcedor”.

Perguntado sobre a existência de uma segregação dentro do futebol, em relação a diversas proibições e aumento do preço dos ingressos, Danilo lamenta viver a cada dia uma elitização do esporte. “O futebol e o carnaval, hoje em dia são umas das poucas veias de escape da população. O preço cobrado nas arenas não condiz com a nossa população. O único clube que vive na contramão disso é o São Paulo”. Após ficar fora da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, o estádio do Morumbi não passou pela modernização de seu tradicional palco. Com a maior capacidade da capital paulista, cerca de 60 mil torcedores, é o único que manteve o baixo preço dos ingressos.   Em relação às novas arenas, Zamboni afirma que deveriam existir setores mais acessíveis para os torcedores e o apoio das autoridades na festa das arquibancadas, valorizando o bom torcedor, ao invés de somente punir.

O atual fundador e presidente do conselho da Escola de Samba Independente Tricolor, fala sobre o olhar de desconfiança e julgamento da sociedade em relação a torcidas organizadas. Segundo ele, a violência praticada pelos integrantes de torcida não pode ser generalizada, e ainda discute o papel da mídia em relação a esta condição. “Tem muita gente boa do lado das torcidas organizadas, infelizmente o que a mídia mostra é o lado da violência”.

Sobre a identificação e punição de integrantes que praticam atos de violência dentro da torcida, Danilo salienta a existência de uma orientação, porém não de um poder necessário para de fato extinguir tais fatores dentro da associação: “A gente orienta, cobra e afasta, mas não temos o poder do crivo da polícia, não temos o poder da lei. Nós lidamos com jovens, que muitas vezes não respeitam nem seus pais. Mas nós temos instituições como a polícia civil, militar e o ministério público, para identificar e punir os verdadeiros responsáveis pela violência”.

Danilo Zamboni afirma que o amor motiva uma torcida organizada, e ainda discorre que tal organização faz o papel do estado, como o atendimento social por exemplo, dando assistência aos associados, mas que nem sempre isso sai na mídia. “Todo o lado social, positivo, você não vê uma nota na mídia, você só vê o lado da violência, porque eles vendem essa parte. Infelizmente um problema em nosso país é a falta de educação. Para os políticos é interessante isso, porque quanto menos pessoas esclarecidas, mais eles podem deitar e rolar. Então é por isso que eles não podem fortalecer uma torcida ou uma escola de samba, porque são órgãos fiscalizadores”, finaliza o torcedor que frequenta estádio desde os seus primeiros anos de vida.

Confira trechos da entrevista com Alessandra Salgueiro, João Paulo e Danilo Zamboni: 

Futebol para todos

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